Por Francislê Neri de Souza, Universidade de Aveiro
Investigadores como Lincoln & Guba (1985) sugerem que os estudos em educação deveriam ser conduzidos em contextos mais naturais em vez de laboratórios ou em experiências com tentativa de controlo de variáveis. Estes autores referiam-se a estas investigações como sendo “naturalistas” ou “construtivistas”, sendo mais tarde estas designações substituídas por termos como “etnografia” e “fenomenologia” (Neri de Souza, 2006, p.145).
Segundo Lichtman (2013), nos primórdios da investigação em educação era esperado que os estudantes se tornassem versáteis nos métodos das ciências comportamentais e nos métodos estatísticos. Somente assim, poderiam conduzir investigações educacionais de natureza experimental. Para este autor, embora a investigação qualitativa seja relativamente nova no âmbito da investigação educacional, isso é cada vez menos verdade neste últimos anos. Diversos autores falam mesmo de uma “reviravolta qualitativa” ou “reviravolta etnográfica” na educação e nas ciências sociais como um todo (Alvesson, 2003; Culyba, Heimer, & Petty, 2004; Neri de Souza, 2006).
Neste ponto, gostaríamos de refletir sucintamente, para além das evidências referidas do aumento do número de trabalhos de investigação qualitativa na investigação em educação, se realmente necessitamos de metodologias qualitativas nesta àrea de investigação. Será que as metodologias quantitativas já não seriam de todo suficientes para tratar da investigação do fenómeno educativo? Para responder a esta questão devemos compreender, de forma ampla e profunda, as problemáticas e questões na investigação em educação.
Numa visão simplista podemos agrupar os focos da investigação educativa: i) nos alunos, ii) nos professores, iii) nos familiares, iv) nas escolas, v) nas instituições, vi) nos instrumentos e estratégias e vii) na sociedade em geral. O problema principal é que todos estes focos não são sistemas fechados, mas sim sistemas que se intercomunicam e interagem de forma complexa. Com a investigação quantitativa é possível configurar cenários amplos e generalizáveis, ou mesmo focos experimentais com uma tentativa, tipicamente que não é plenamente conseguida, de controlo de variáveis, mas nunca compreender profundamente a rede intricada e multifacetada da realidade educativa. Por outro lado, na investigação qualitativa temos a possibilidade de agrupar diversas estratégias de investigação para compreender, de forma profunda, o contexto e as suas características comuns.
Em suma, se temos problemas em educação que pressupõem investigação aprofundada e contextualizada, necessitamos realmente das metodologias qualitativas e das suas conjugações. Outra vantagem que temos atualmente, que não tínhamos nos primórdios da investigação qualitativa, é a possibilidade de articular de forma flexível e sistemática, durante todo o processo, todos os contextos e tipos de dados com apoio de software, tal como o webQDA. A figura abaixo ilustra, por exemplo, a versatilidade de codificar vídeo e texto num sistema de códigos dinâmico e flexível. Aqui se pode visualizar o sistema de códigos editável, as suas definições, o documento original e as partes da sua transcrição e contagem de referências de uma forma integrada.
Referências Bibliográficas
Alvesson, M. (2003). Methodology for close up studies – struggling with closeness and closure. Higher Education, 46, 167–193.
Culyba, R. J., Heimer, C. A., & Petty, J. C. (2004). The Ethnographic Turn: Fact, Fashion, or Fiction? Qualitative Sociology, 27(4), 365–389.
Henwood, K. L., & Pidgeon, N. F. (1992). Qualitative research and psychological theorizing. British Journal of Psychology, 83, 97–111.
Lichtman, M. (2013). Qualitative Research in Education: A User’s Guide: A User’s Guide (3th ed.). London: SAGE Publication.
Lincoln, Y. S., & Guba, E. G. (1985). Naturalistic inquiry (1o). London: Sage Publications.
Neri de Souza, F. (2006). Perguntas na Aprendizagem de Química no Ensino Superior. Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa. Universidade de Aveiro, Aveiro.
* Saiba mais em: https://revistas.ulusofona.pt/index.php/rleducacao/article/view/5092
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